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Conto

Fofíssima #2

Tá, o meu sumiço. Lembra da Babi falando que a química era importante, que no final das contas o que contava mesmo era sentir ou não aquele negócio ao cheirar o pescoço da pessoa? E eu perguntava, sério, que negócio? Ah, Lilian, ela dizia, cê sabe do que eu tô falando. Não sabia. Eu juro que não sabia. Aí teve aquele campeonato entre as faculdades e todo mundo ganhou as canecas de alumínio, o centro acadêmico investiu pesado, lembra?, só que trocaram meus L por dois V e eu virei Vivian por um final de semana. Você e a Babi só me chamavam de Vivian, oi, Vivian, vem ver isso daqui, Vivian. Um saco. E tudo da Babi era vamos, gente, vamos viver, vamos! E lá fomos nós fazer as vezes de cheerleaders, lembra?, com pompom e tudo, lembra?, bem ridículas e com as canecas penduradas no pescoço. Até conhaque tomei lá, lembra?, pra nunca mais. Mas a química, aquele papo de química e cheiro de pescoço da Babi. Isso era uma puta de uma mentira, pelo menos para mim era uma puta de uma mentira. A Babi, cê lembra?, toda empolgada com a vitória do time de futsal, com o Rodrigo ou com o Caio, cê lembra?, e a gente lá servindo de coadjuvante para a comédia romântica da vida dela. Ela sumiu foi com o Caio, lembra?, porque o Rodrigo cresceu foi para cima de mim, que otário, todo suado e tirando os pompons da minha mão e achando a coisa mais divertida do universo colocar os dedos sujos e suados em minha caneca. Mas seu nome é Lilian, ele repetia, todo boçal, por que tá escrito Vivian?, seu nome é Lilian, e o cheiro de suor da camiseta, cê lembra?, e eu olhava para a Babi e não entendia como ela conseguia mergulhar no pescoço do Caio. Será que não estava fedendo igual ao Rodrigo? E ela sumiu, lembra?, no meio da confusão de gente com o fim do jogo e eu fui dando passos para trás e tentando te chamar sem parecer que queria morrer. A merda do menino parecia não aceitar o simples fato de terem trocado as letras em minha caneca e ficava repetindo que meu nome era Lilian, como se eu não soubesse. E a partir daqui não dá mais para perguntar se você lembra de alguma coisa, né, meu sumiço, ok. Eu deixei aquele imbecil segurando a caneca-Vivian e corri daquele ginásio. Sentir o cheiro de cloro das piscinas depois daquele abafamento úmido foi um alento. Vocês estavam adorando e eu nem caneca tinha mais. Dá até vergonha dizer que quis chorar vendo o sol sumir lá longe, talvez fosse o conhaque de mais cedo, quem sabe?, mas nem chorei. Daí tomei o rumo do luau, lembra? Não? Ok, tinha um lugarzinho lá com aquelas tochas e lâmpadas em corda, sabe?, no meio da grama entre umas palmeiras e tava lindo o entardecer, ou talvez fosse só o conhaque de novo, quem sabe?, e tinha uma galera dançando forró, sim, forró, ao som de por isso eu vou pra casa dela, ai, ai, falar do meu amor pra ela, ai, ai, e me bateu uma timidez súbita por estar ali, mas uma menina com caneca, tipo as nossas, mas não das nossas, pegou de leve em minha mão e me convidou sem falar nada para dançar, talvez fosse o conhaque mesmo, pois eu topei e topei muito, sim, e daí eu lembrei da Babi falando que a química era importante, que no final das contas o que contava mesmo era sentir ou não aquele negócio ao cheirar o pescoço da pessoa, e o pescoço daquela menina, sério, falar do meu amor pra ela, ai, ai, tinha o mesmo cheiro das piscinas do lado de fora do ginásio, misturado com, sei lá, suor?

Tags : amorbeijofofíssimahumormúsicarelacionamentos
Marcos Marciano

The author Marcos Marciano

Marcos Marciano é um ser humano amador. Formou-se em Psicologia pela Universidade Federal de Minas Gerais, lê livros por esporte e escreve por falta de vergonha na cara. Ainda não sabe por que a Débora resolveu se casar com ele.

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