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Reflexão

O inferno somos nós

Uma vez eu li em algum lugar (eita memória boa!) que não deveríamos nos preocupar com o que os outros estão pensando de nós, porque eles estão ocupados demais imaginando o que nós estamos pensando deles. Dito isso, gostaria de compartilhar cinco observações que me fazem acreditar que o inferno não são os outros, somos nós.

1. Damos a nós mesmos uma importância muito grande

Essa é uma verdade inconveniente, mas ainda assim verdade. Se passamos uma parte do nosso tempo especulando sobre o que os outros estão pensando de nós, então aí está embutida uma afirmação: os outros estão pensando algo sobre nós. 

O que o faz acreditar que alguém está gastando o próprio tempo fazendo críticas a você? Em geral, não somos tão importantes assim. Eu costumo pensar o seguinte: se alguém tem algo a me dizer e tem intenção de me ajudar, a pessoa irá me dizer, e isso me desobriga de ficar especulando o que seria esse assunto; se alguém tem algo a me dizer e não tem intenção de ajudar (e, por isso, prefere falar pelas costas), essa pessoa não vale uma dor de cabeça minha, não vale especulações e não vale a minha preocupação em agradá-la.

2. O olhar dos outros nos incomoda. Ou seria o nosso próprio olhar?

Em algumas situações, projetamos no olhar dos outros os nossos próprios demônios e inseguranças. Observe esse raciocínio: se você está imaginando o que outra pessoa está pensando a seu respeito, você está criando hipóteses. Essas hipóteses estão partindo de você mesmo, logo, você está com medo de que outra pessoa pense a seu respeito o que você pensa sobre si. Fique com esse nó na cabeça por enquanto!

3. Damos à opinião dos outros uma importância muito grande

Esse tópico guarda íntima relação com o item 2 dessa lista. A opinião dos outros frequentemente vem para: a) reiterar o que pensamos de nós mesmos, ou para b) fortalecer ideias quando estamos inseguros a respeito delas.

a) Opinião dos outros para reiterar o que pensamos de nós mesmos:

Se eu acreditar que sou chata, qualquer opinião que eu imputar aos outros que demonstre que eu sou chata só vai reforçar essa ideia que eu tenho de mim mesma. Certo?

Outro viés relacionado à opinião dos outros como o reforço do que pensamos sobre nós mesmos é que muita gente deixa de fazer coisas com receio do que as outras pessoas irão dizer. “E se eu fracassar, o que vão pensar de mim?”; “Prefiro nem começar para não ter chance de errar perante as pessoas”. Ao pensar assim, você evita agir. Ao evitar agir, você reforça o pensamento que alimenta a sua insegurança. Sentir-se seguro em qualquer ambiente da vida requer prática, e prática só existe quando você se permite arriscar. Portanto, a única coisa que você consegue ao sentir medo da opinião dos outros e em função disso não levar a sua vida adiante é deixar de combater as suas inseguranças. Você ficaria preso para sempre, por isso precisa existir um ponto de ruptura.

b) Opinião dos outros para fortalecer ideias quando estamos inseguros a respeito delas:

Se você conseguir dosar, a opinião dos outros pode ser muito bem-vinda. Em momentos de dúvida sobre cortar ou não o cabelo, qual pedido vocês vão fazer no restaurante, qual o sabor da pizza que vocês vão pedir no delivery ou quando você tem diversas opções e gostaria de discutir as ideias com alguém em quem você confia. Seja para questões simples ou complexas, é possível ter benefício em ouvir alguém.

No entanto, quando você é uma pessoa muito insegura e recorre à opinião dos outros para tomar decisões ou para se certificar de que as decisões que você tomou foram boas, isso tem o potencial de te tornar dependente dos outros e de se ver “preso” tentando agradá-los para não os perder.

4. Somos resistentes às críticas

Raras são as pessoas que se sentem confortáveis quando estão sendo criticadas. A gente se sente meio nu quando tem um terceiro apontando nossas falhas. Em linguagem empresarial, arrumaram um nome bonito em inglês: feedback. Tem gente estudando muito esse assunto e propondo a maneira mais legal de dar um feedback, que geralmente é: mostrar o que a pessoa está acertando, reconhecer isso, apontar onde ela pode melhorar e estar ao lado nesse processo de desenvolvimento, acompanhando, reconhecendo os ganhos e dando apoio quando necessário. Feedback não é apontar falhas e destruir a pessoa que está ouvindo, é o reconhecimento do que está bom e desenvolvimento do que pode ser aprimorado.

Se formos mais sensíveis no momento de criticar uma pessoa – no âmbito pessoal ou profissional – as críticas podem passar a ser mais bem-vindas. Ao mesmo tempo, se formos mais abertos para receber as críticas, podemos fazer coisas legais para nós mesmos e nos relacionar melhor. Podemos parar de sofrer com o pensamento do outro e usá-lo em nosso benefício para crescer.

5. Fazemos o que podemos para não assumir a culpa

Se você tem um casal de amigos em que ambos são muito próximos a você, é possível que já tenha escutado duas versões de uma mesma briga. O narrador é peça fundamental no momento de contar uma história: ele possui crenças, convicções e uma imagem a zelar. Não existe pessoa imparcial, porque estamos impregnados da nossa história de vida. É natural que nos defendamos quando necessário.

Às vezes foi a gente que pisou na bola, mas criamos toda uma narrativa que explica o que aconteceu antes do que nos levou a pisar na bola. Colocamos uma culpa anterior em alguém ou em alguma coisa de forma a justificar o que nós fizemos. Muitas vezes, não assumimos responsabilidade por coisas que nós mesmos temos o poder de melhorar. Por exemplo: se eu acho que o pessoal do trabalho não conversa comigo porque eu devo ser chato ou porque eles são chatos – ou uma mistura disso –, mas eu não tomo iniciativa de falar com eles, a responsabilidade por termos uma relação distante é minha. Se eu tentar me aproximar e isso não der certo, já posso dizer que tentei e que a responsabilidade não é mais minha.

Agora que já falamos sobre o quanto atribuímos aos outros esses cinco fatores, que na verdade podem ser voltados para nós mesmos, queria compartilhar com vocês duas formas que eu acredito que podem nos ajudar a não criarmos um inferno dentro da nossa própria pele.

Duas formas para combater as questões acima:

1. Sempre se pergunte o porquê

Faça o esforço de tentar entender as situações com mais clareza. “Por quê?” é uma pergunta que cabe em quase todas as situações. Veja bem:

– Por que estão pensando alguma coisa de mim?

– Por que estou preocupado com o que estão pensando de mim?

– Por que eu acho que vão acreditar ___________ sobre mim?

– Por que eu mesmo penso que sou ___________?

– Por que estou resistente a essa crítica que recebi?

– Por que estou colocando a responsabilidade de ___________ em fulano? Será que eu tenho alguma responsabilidade nisso?

Colocar uma lupa em cima das situações que você vive vai te gerar informações. Com elas você poderá fazer algo a respeito para melhorar a sua vida.

2. Sinta mais amor por você mesmo

O caminho mais rápido para não se preocupar tanto com a opinião dos outros é criar uma opinião sua melhor sobre você mesmo. Em vez de ficar acreditando em coisas ruins e de dar importância elevada demais aos seus “defeitos”, dê enfoque nas suas qualidades e trabalhe nos seus pontos fracos para se sentir melhor, isto é, fortaleça a sua autoestima e sua autoconfiança. Tente levar um estilo de vida honesto consigo mesmo em que você possa estar próximo das pessoas e coisas que gosta.

Para concluir, apenas mais algumas palavras. Nesse texto eu quis abordar que muitas vezes pensamos que o problema está nos outros, no olhar deles, nas críticas, nas fofocas. O movimento que eu estimulei que você faça é o contrário: voltar para dentro, em vez de acreditar que o problema está lá fora. Se você está suscetível ao pensamento dos outros, é um sinal de que precisa fortalecer algumas coisas sobre si mesmo. Voltar-se para dentro é uma forma de ter controle sobre a situação para melhorar a sua vida e ser mais feliz. Se você vive em meio a pessoas fofoqueiras, tóxicas, negativas e que desejam o mal para os outros, a primeira coisa é criar um escudo contra essas influências e a segunda é rever as suas relações. Torne-se responsável por construir o seu pedacinho de céu.

Tags : comportamentocríticainfernoopinião dos outrospsicologiavida em sociedade
Débora Lopes

The author Débora Lopes

A profissão oficial é psicóloga, mas faz um monte de coisas. Devoradora de livros, maratonista de seriados, mãe de cachorro... Débora é uma jovem idosa que jamais recusa um café com os amigos. Ama viajar, especialmente para lugares frios.

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