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Reflexão

Álbum de figurinhas contemporâneo

Terça-feira, um dia tão normal quanto qualquer outro. 

Um dia tão igual quanto qualquer outro.

Acordar, assistir às aulas, estudar, dormir e comer. Essa tem sido minha rotina desde março de 2020. Um ano já se passou e, na mesmice do meu dia a dia, sinto como se eu estivesse estacionada numa realidade atemporal, em que não se pode medir o tempo, em que talvez o tempo já não seja mais tempo.

Eu recebi um comunicado da minha escola ontem. Na minha cidade querem que as instituições escolares sejam postas como serviços essenciais. Achei um absurdo e eu como aluna, filha, cidadã e, sobretudo, como ser humano, me nego a aceitar as atrocidades declaradas no arquivo que enviaram.

No entanto, o verdadeiro ponto desse texto é a minha procura pela compreensão da conjuntura atual. Afinal, quando foi que o egoísmo se sobrepôs à valorização da vida?

Porque sim, é egoísmo, não há argumento para você, querido leitor, que defenda as atitudes das pessoas nessa pandemia.

Não, não é desculpa que já se passou muito tempo. Não, não é desculpa que a economia vai colapsar. Não, não é desculpa que uma única saída sua com os amigos depois de tanto tempo não vai fazer mal a ninguém.

Porque faz diferença. Faz diferença quando é um parente seu precisando de leito no hospital. Faz diferença quando é um parente seu sendo enterrado da forma mais medíocre que a gente poderia imaginar um dia enterrar um ente querido. Faz diferença quando você leva essa culpa para o resto de sua vida, se cobrando que, se tivesse feito diferente, as coisas poderiam ter tomado um rumo melhor.

Ainda hoje é possível trocar ideia com uma pessoa que acredita convictamente que “todo mundo vai pegar mesmo” ou que “vão morrer milhares e não tem o que possamos fazer para mudar isso de qualquer modo”. Eu me pergunto quando é que quem pensa assim vai perceber o quão errôneo e desumano é acreditar nisso. Ao meu ver, é um grande equívoco desmerecer a vida de alguém, pois, se a sua é tão importante para você, por que a do vizinho não deveria ser também?

Entretanto, não adianta discutir, nem insistir. Não importa quantos rostos vão passar na televisão, ou quanto mais os dados sobre o vírus vão subir. A dengue ainda mata mais, não é mesmo? Ou seriam os atropelamentos?

Foi-se o tempo em que havia o luto mundial para os 300 mortos de um avião que caiu no mar. Hoje são 3.000 por dia, mas alarde-se! Ainda não batemos os EUA, estamos tranquilos então.

Minha convicção na humanidade nunca foi tão utópica quanto é hoje em dia.

Hoje é terça-feira e, apesar da mesmice, uma notícia sempre vai trazer uma nova decepção, como se as vidas perdidas agora fossem essenciais para esse moderno álbum de figurinhas.

Tags : covid-19escolapandemiareflexão
Alice Lopes

The author Alice Lopes

A mais nova da família, Alice é escritora de fanfic para kpoperos desde 2017. Recém-envolvida pelo mundo dos animes, ela adora livros e seus passatempos preferidos são comer e dormir, além de uma boa conversa com as amigas sobre coisas bobas.

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